Um grupo de pessoas habitantes de vilas remotas no Equador possui uma mutação genética que trouxe novos horizontes no que se diz respeito aos estudos relacionados à longevidade humana.
Essas pessoas são portadoras de uma síndrome rara conhecida como Síndrome de Laron. O grupo de aldeões, com 99 pessoas com a síndrome, foi estudado durante o período de 24 anos por Jaime Guevara-Aguirre, um médico equatoriano especializado em diabetes, com participação de Valter Longo, pesquisador da área de envelhecimento da Universidade do Sul da Califórnia.
Os portadores da síndrome possuem uma mutação no gene relacionado à síntese de um receptor para o hormônio do crescimento (GH), o qual não possui as suas oito subunidades da região exterior. Dessa forma, os aldeões possuem disfunção no crescimento, não excedendo 1,10m de altura.
Jaime Guevara-Aguirre (atrás, ao centro) com seus pacientes.
Para melhor elucidar os aspectos bioquímicos associados à ação do GH e do IGF-1, a Síndrome de Laron e a senescência, segue a seguir uma descrição dos mecanismos de ação desses hormônios:
O GH é um hormônio relacionado ao crescimento e desenvolvimento, sendo produzido e secretado pela glândula hipófise anterior. O seu mecanismo de ação envolve a ligação a receptores específicos transmembrana, os quais são dimerizados. Após a dimerização do receptor, ocorre a ligação e ativação da tirosina quinase JAK 2, que é responsável pela sinalização celular através da fosforilação de moléculas que se ligam ao DNA e ativam os genes alvo do GH.
O GH induz a ação do fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-1), o qual é sintetizado predominantemente nos hepatócitos. A ação do IGF-1 a nível celular inclui a associação a receptores IGF-R e posterior sinalização celular por meio de proteínas como as da família IRS, AKT, TOR, etc. O IGF-1 é um fator de crescimento e diferenciação, estimulando funções especializadas em tecidos endócrinos, induzindo a expressão de miogenina em células musculares esqueléticas, entre outras funções.
Agora que o nobre leitor já conhece a forma como os hormônios supracitados agem, retomemos o estudo do grupo populacional portador da Síndrome de Laron.
Pois bem, é justamente a deficiência no receptor específico para o GH e os baixos índices de IGF-1 dos portadores da síndrome que podem revelar aspectos extremamente relevantes quanto à longevidade. Um estudo realizado na Universidade de Ohio demonstrou que uma linhagem de camundongos portadora da mesma mutação dos aldeões vive 40% a mais que o esperado. Esse aspecto foi ainda mais evidenciado com a constatação de que o soro dos pacientes com a síndrome apresentou dois efeitos significativos: 1) o soro protegeu as células dos danos genéticos. 2) ele induziu as células que ficaram danificadas a autodestruírem-se, impedindo que estas se tornassem cancerosas. A adição de pequenas quantidades de IGF-1 ao soro promovia anulação de ambos os efeitos.
Sendo assim, a razão para a relação entre os baixos índices de IGF-1 e a longevidade é, possivelmente, o primeiro efeito citado: os baixos níveis séricos desse fator podem proteger as células dos danos genéticos que aceleram o processo de envelhecimento.
Os pesquisadores concluíram ainda que a baixa ação desses hormônios acarreta uma diminuição do risco de doenças tipicamente associadas ao envelhecimento, como câncer e diabetes tipo 2. A diminuição da incidência de câncer está relacionada ao segundo efeito explicitado acima: a autodestruição das células danificadas geneticamente. A diminuição do risco de diabetes relaciona-se ao fato de que os baixos índices de IGF-1 promovem uma maior tolerância à insulina.
Essa descoberta traz, portanto, novos horizontes no que se diz respeito ao conhecimento dos fatores que promovem o processo de envelhecimento e as patologias correlacionadas, bem como o desenvolvimento de novos fármacos que um dia poderão ser “o segredo da longevidade”.
Referências Bibliográficas:
Escrito por: Matheus de Oliveira Andrade.
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